"a vida é tão rara"
Que vontade de avisar meus amigos, ter o poder da vidência para lhes avisar do evidente.
Que a morte está ali na esquina, sentada no meio-fio, pronta pra sugar suas vidas.
Que o "desculpe-me", o "te amo" e principalmente o "ame-me" tem que sair agora das nossas gargantas.
Antes que os vermes comam-nas, logo após comerem nossas línguas.
A vida é mesmo rara. E curta. Uma "fagulha do átomo" do tempo.
Queria ser vidente. Para evitar o evidente.
Mas não podendo queria só avisar meus queridos.
Da urgência da vida. E da ineficiência dela. E da eficiência da morte, que nunca falha, mesmo que tarde.
Pena nem sempre tardar.
Para que eles abracem-se e me abracem.
Antes da imobilidade perene e eterna de seus braços, colados em seus corpos, apertados pelas tábuas.
Sorrisos em fotos antigas e em selfies modernas. Apagados.
Ontem sorria e hoje a boca é fechada e calada. Lábios sem cor, porque "arroxeado" não é cor.
Nesta vidência improvável, usar então de minha vivência, para avisa-los.
Que urge. Que ruge.
Que rugas talvez nem se formem em seus rostos nem nos rostos de seus amados.
Tantos rostos lisos, emoldurados por flores colhidas. Ceifadas.
Vidas também ceifadas
Avisar que os toques e sinais da cruz em nossas faces e testas só sentiremos antes de dobrar a esquina.
E sermos chamados a sentar com ela no meio fio.