A tão sonhada aposentadoria enfim chegou para o agricultor familiar João Mendes de Souza, de 63 anos, residente da Comunidade Águas Claras, a 20 km de Agrovila das Palmeiras, no munícipio de Santo Antônio de Leverger. Ele foi um dos atendidos durante o Ribeirinho Cidadão e disse que se não fosse o projeto, não teria conseguido o benefício. Após anos de esforço, a lida de sol a sol trouxe a recompensa.
Com mais de 15 anos de comprovação de atividade rural, seo João tentava há três anos se aposentar. Depois da análise de documentos, ele teve o benefício concedido. “Eu trabalho desde os sete anos de idade e moro em Águas Claras desde 1977. Lá eu casei, tive meus filhos e trabalhei a vida toda. Precisou o Ribeirinho vir pra cá para eu conseguir aposentar. Estou muito alegre porque o Ribeirinho resolveu minha vida”, disse o agricultor, com um misto de sorriso e alívio.
Quem também compartilhava dessa felicidade era a esposa de seo João, dona Francisca. Juntos há mais de 30 anos, ela diz que o dinheiro da aposentadoria é merecido pelo quanto o marido trabalhou. “Nós trabalhamos muito, acordamos às cinco da manhã e graças a Deus hoje ele conseguiu se aposentar. Esse é um direito dele, mas mesmo assim vamos continuar trabalhando”, falou.
Moradora do assentamento Banco do Brasil, Elizana de Oliveira Dantas saiu de casa às 3h da manhã para percorrer mais de 30 quilômetros e chegar cedo à Escola Estadual Nagib Saad para poder fazer documentos de identidade e CPF dos três filhos e se recadastrar no programa Bolsa Família. Às 6h30, ela já estava no local e sua principal reclamação foi quanto às estradas.
“O trecho não é tão longo, mas as estradas estão horríveis. Mesmo assim não desisti e vim. É essencial esse mutirão porque daqui para ir para Cuiabá tem que pagar ônibus e não é todo dia que tem e para levar os três ficaria muito caro. Vocês vindo até aqui fica muito melhor, ainda mais que é tudo de graça”, falou.
O amor também embalou os atendimentos. Cinco uniões foram formalizadas, entre elas a do lavrador Claudinei Francisco de Souza e da dona de casa Josefa Silva de Oliveira Souza, moradores da Comunidade Taquaral (a 12 km da Agrovila das Palmeiras). Eles estão juntos há 22 anos e têm cinco filhos. “A gente não tinha condição de pagar para casar e agora surgiu a oportunidade e não perdemos tempo. O sonho da minha vida era ser casado no papel e, depois de muita oração, hoje é realidade, graças ao Ribeirinho Cidadão ter vindo aqui”, contou.
Quem voltou mais aliviada para casa foi Rosiane Guedes da Silva, de 24 anos. Ela compareceu ao mutirão para levar a filha de seis anos ao médico. A criança tem sopro no coração e já passou por cirurgia, mas, segundo ela, talvez seja necessária nova intervenção cirúrgica. “O médico fez encaminhamento para um cardiologista e pediatra para acompanhamento mais de perto, mas não sei como vou fazer porque aqui não tem médico e já perdi consulta em Santo Antônio porque eu não tinha dinheiro para ir. Mesmo assim foi ótimo a gente ter médico para nos atender, ele ajudou minha filha, tirei dúvidas e consegui receita para pegar medicamento”, relatou.
A Agrovila das Palmeiras é uma comunidade com cerca de três mil habitantes, localizada a 140 km do município de Santo Antônio de Leverger, e quando os moradores precisam se deslocar até a cidade, é preciso enfrentar horas de estrada de chão e pontes de madeira. Inclusive os moradores de outras comunidades da região também enfrentam a mesma situação. Com a cheia do rio Cuiabá, tudo fica mais complicado. E é nesse período que o projeto Ribeirinho Cidadão chega para levar dignidade aos moradores, já que nesta época o trajeto fica inacessível e a população sofre com a falta de serviços básicos. Foram dois dias de intenso atendimento na sexta-feira e sábado (22 e 23 de fevereiro), na Escola Estadual Nagib Saad.
A informação repassada à coordenação do projeto foi que com a chuva que assolou a localidade, muitas pessoas de assentamentos e sítios vizinhos não conseguiram chegar à Agrovila, ou por conta dos alagamentos nas estradas ou porque um dos trechos cedeu, abrindo uma enorme cratera. O juiz que coordena o Ribeirinho Cidadão no âmbito do Judiciário, José Antonio Bezerra Filho, falou dessas dificuldades enfrentadas pela população, o que só comprova a importância da união dos parceiros para fazer chegar esses serviços a essas comunidades isoladas pelas chuvas.
“Aqui temos o Pantanal e mais uma vez vimos o povo isolado, vimos a dificuldade de acessibilidade, pontes e estradas alagadas. O nosso objetivo foi levar e prestar todos os serviços os quais nós colocamos à disposição. Essa é a nossa missão e fizemos o melhor. Demos todo atendimento a essa população necessitada. O importante é que o grupo esteve unido no mesmo propósito”, ressaltou.
Denúncia - Durante os atendimentos, a equipe do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e Conselho Tutelar de Santo Antônio de Leverger, parceiros do Ribeirinho Cidadão, receberam denúncia de abandono de incapaz e maus-tratos de dois irmãos idosos, de 86 e 84 anos, que vivem sozinhos em uma residência em Agrovila das Palmeiras. A equipe se deslocou até o local com duas enfermeiras e integrantes da Defesa Civil de Mato Grosso. Foi constatada a situação de precariedade em que eles vivem.
De acordo com a coordenadora do Creas, Carla Alexandrina Ribeiro Ito, psicóloga e assistente social serão encaminhadas à casa deles para análise técnica da situação.
Serviços - Foram oferecidos cortes de cabelo masculino e feminino, penteados, doações de roupas, calçados, toalhas, meias, camisetas e brinquedos. Além disso, a população pôde tirar foto 3x4, confeccionar identidade, CPF, carteira de trabalho, segunda via de certidões de casamento, nascimento e óbito, fazer cadastro no Bolsa-Família, se vacinar, receber orientação do Conselho Tutelar, psicólogo e assistente social, plastificar documentos, participar de medição, realizar divórcio, pleitear pensão alimentícia, receber atendimentos do INSS, Defensoria e cartórios, além de casar no civil.