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Quinta, 25 de maio de 2017, 16h03

A Ponte da Confusão repercute na Câmara Municipal


o mês de junho, do ano de 1958, o povo cuiabano e a classe política, voltaram-se para o que ficou conhecida como a "Ponte da Confusão". Naquele período, a política nacional e a regional, estavam polarizadas em dois grandes partidos: a UDN (União Democrática Nacional) e o PSD (Partido Social Democrático). Na Câmara Municipal de Cuiabá havia uma maioria udenista, representada pelo Presidente Armando Santana Modesto, que apoiava o Prefeito José Garcia Neto, de seu partido, e demonstrava forte oposição ao Governador João Ponce de Arruda, político do grupo adversário, do PSD.

No ano de 2004, o jornalista Paulo Zaviasky entrevistou contemporâneos do fato, dentre eles o ex-prefeito Garcia Neto, um dos personagens do episódio. Zaviasky nos ajuda a com-preender esse evento histórico, um evento com doses de tensão e, por que não, de humor.

A ponte seria construída no bairro do Baú, sob o córrego da Prainha. Uma obra que há tempos era reivindicada pelos vereadores e moradores, uma ligação entre os bairros do Baú e do Araés. A "confusão" começou, segundo Zaviasky, quando o Governador do PSD deu início às obras e o Prefeito foi alertado por moradores. De imediato, o Prefeito Garcia Neto foi até o local e sequestrou 25 tubos de concreto.

Logo em seguida, o Prefeito determinou a construção da ponte, mas dessa vez foi o Governador que interrompeu as obras, enviando para o local o Chefe de Polícia. O jornalista Zaviasky afirma que até o Exército foi convocado "para intervir no bate-boca, mas não houve feridos nem mortos. Alguns tiros para o ar, que muitos afirmaram que eram fogos de artifícios".

A tensão repercutiu na Câmara Municipal, em uma Sessão Especial, no dia 10 de junho, convocada para a discussão desse incidente, o vereador udenista Jaime de Figueiredo foi à tribuna e pronunciou:

“De momento a momento, o que vemos são justamente arbitrariedades que vêm de um modo, ofender ao nosso Prefeito José Garcia Neto. Haja visto o que está aconte-cendo neste momento, no Baú, onde Garcia Neto iniciou a construção daquela ponte e onde o candidato a Prefeito manda proibir, de mãos armadas, que o nosso Prefeito continuasse a fazer o trabalho."

O candidato a Prefeito, referido pelo vereador Jaime de Figueiredo, era o Sr. Júlio Müller, político poderoso e influente, Interventor em Mato Grosso durante a ditadura do Estado Novo, de Getúlio Vargas. Ele contava com o apoio do Governador e queria ser o responsável pela construção da ponte, um presente antecipado do candidato do PSD à população cuiabana.

Prossegue o discurso do vereador Jaime de Figueiredo:

"Venho protestar contra esse ato arbitrário, desse processo que não conhece a autoridade do Sr. Prefeito, mandando destruir o trabalho. Pela falta de força, de valor perante o povo, o Governo (Estadual), de mãos armadas, manda aqui, assim. Eu venho protestar, se o Prefeito não trabalha e, se mais não tem feito é porque o governo negou tudo. A Câmara requer um voto de solidariedade à Prefeitura da Capital."

Seguem-se discursos, e o próximo a protestar é o vereador Agostinho Dias Dorilêo, também do partido do Prefeito, que defendeu a autonomia municipal:

“Quando nós assumimos nossas funções, dizíamos de defender o nosso município, nosso povo. Agora o que se passa é lamentável e nós devemos lutar pelo interesse básico que é a autonomia Municipal."

O Presidente Armando Santana Modesto também foi à tribuna, e protestou:

“Senhor Presidente, Senhores Vereadores. É revoltante o que se passa na sede da nossa cidade. Ontem, Garcia Neto iniciava a construção de uma ponte. E o que a-contece? O Governo (do Estado) manda para lá, a polícia, para que não construísse, para que não se continuasse com a obra. Mas, pela altivez do Sr. Prefeito, pela sua coragem, a obra é continuada!"

O Prefeito Garcia Neto fez a ponte, "colocou os tubos-manilhas na ordem da corrente do riacho ou córrego da Prainha e compactou terra por cima. Começou os trabalhos a uma da tarde e, à meia-noite, com um caminhão e um trator da prefeitura, a ponte estava pronta", afirma Zaviasky.

Retornemos ao discurso do Presidente Armando Santana Modesto:

"Tive a infelicidade de ouvir do Sr. Júlio Muller em seu discurso, dizendo que ele iria mostrar ao povo quem ele é. Isto é uma voz de alerta! Se ele, antes de sua eleição lança a polícia para impedir a construção de uma ponte, o que fará depois de eleito?"

Sobrou ainda para os vereadores pessedistas, a vereadora Maria Nazareth Hahn e o vereador Antônio Monteiro da Silva, que não compareceram àquela sessão. Disse o Presidente:

"Os representantes do PSD aqui não comparecem para ao menos dizerem alguma coisa. Aqui eles não estão, quando se convoca uma sessão, quando se protesta contra esses acontecimentos."

Prossegue o Presidente:

"Aqui fica o protesto da UDN. Do PSD, não houve! Estão solidários com os atos do Go-verno! Não vieram, porque o assunto trata do auxílio ao povo. Tenho certeza que o povo consciente saberá levar às urnas, à vitória, os homens que lutam pelo bem estar da coletividade. E esta vitória será da UDN, pois o PSD não defende o povo."

Júlio Müller foi derrotado nas eleições municipais de 3 de outubro pelo candidato da UDN, o Dr. Hélio Palma de Arruda. Segundo uma coluna do jornal O Estado de Mato Grosso, Hélio Palma venceu de palmo a palmo, em uma demonstração de interesse do povo cuiabano na política e na cidade. Uma grande festa para os udenistas, que saíram vitoriosos, e que após a divulgação do resultado, realizaram um verdadeiro carnaval na Praça da República, com rasta-pé e foguetórios.

Não é possível afirmar que esse evento foi fundamental para o resultado da eleição para Prefeito, visto que a população não se resumia apenas aos moradores do Baú e do Araés. Percebe-se sim, a polarização política e o certo domínio da UDN, que na Câmara Municipal, contava com cinco dos nove vereadores, e ocupava todos os cargos da Mesa Diretora.

Não podemos mais encontrar a tal Ponte da Confusão. Ela foi enterrada pelo concreto que preencheu o córrego da Prainha, mas a sua história permanece, cheia de simbolismos, na memória de Cuiabá e da nossa Casa Legislativa.  




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