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Pesquisa/Tecnologia
Sábado, 10 de março de 2018, 06h55

Excesso de CO2 no ar intensifica a expiração ativa durante o sono


Ao respirar, a ventilação pulmonar é composta pelo processo cíclico de inspirar e expirar o ar. O ato de inspirar é espontâneo e um processo ativo que envolve também a contração de um conjunto de músculos (inspiratórios) do corpo, como o diafragma. Para expirar, o processo é passivo, pois não envolve a musculatura. É uma reação.

Hipercapnia é o aumento do dióxido de carbono no sangue arterial, resultado da maior concentração de CO2 no ar. Nessas situações, a expiração antes passiva se torna ativa, recrutando a ação de músculos expiratórios (principalmente os abdominais) para aumentar a capacidade respiratória. Durante o sono, essa condição é amplificada. Tudo de modo automático e sem afetar o sono. Foi o que verificaram pesquisadores da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Jaboticabal.

“Conseguimos demonstrar que em situações de hipercapnia, quando há uma demanda ventilatória aumentada, a musculatura abdominal entra em ação e a expiração deixa de ser passiva. Esteja o indivíduo acordado ou dormindo, a musculatura abdominal é recrutada na hipercapnia, só que é mais intensa durante o sono”, disse Glauber dos Santos Ferreira da Silva, um dos autores do estudo, à Agência Fapesp.

O estudo, apoiado pela Fapesp por meio do programa Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes e por duas bolsas de iniciação científica, foi publicado no The Journal of Physiology.

Ratos adultos machos expostos a condições de hipercapnia (7% de CO2 no ar ambiente) tiveram eletroencefalograma (EEG), diafragma e músculos abdominais (EMG) monitorados por eletrodos. Com isso, foi possível observar que, nos períodos de hipercapnia, a expiração ativa (ou seja, recrutamento respiratório da musculatura abdominal) foi predominante durante o sono não REM – fase do sono em que não há sonho nem movimento repetitivo dos olhos.

Da Silva explica que os registros durante o sono foram feitos apenas durante a fase não REM. Isso porque a característica do sono em ratos é diferente da apresentada por humanos.

“O rato tem maior atividade durante a noite e dorme mais durante o dia. Todos os experimentos foram feitos no período diurno, lembrando que o sono do rato não é contínuo, como geralmente é o de humanos. O rato passa pelos mesmos estágios pelos quais passamos, só que de forma mais fragmentada, o que torna difícil, durante a hipercapnia, registrar o sono REM que ocorre em episódios curtos”, disse.

De acordo com o estudo, a atividade do músculo abdominal foi ainda mais intensa e se tornou mais variável durante o sono, se comparada aos períodos de hipercapnia na vigília. Da mesma forma, a expiração ativa foi muito mais prevalente durante o sono, embora apresentando intermitência.

“É provável que isso ocorra com humanos também. Esse processo de recrutamento da musculatura abdominal vem sendo estudado desde a década de 1980, só que nos últimos cinco anos houve um reavivamento dessa área de estudo, pois foi descoberta uma região no sistema nervoso central, o chamado grupo respiratório parafacial, que é responsável por originar essa atividade expiratória”, explicou Da Silva.

Hipercapnia e obstrução

Situações de hipercapnia podem ser comuns em condições como as síndromes de obstrução das vias aéreas, sendo a apneia obstrutiva do sono a mais conhecida delas. Nessas condições a musculatura que é responsável por dilatar as vias aéreas superiores tem o tônus reduzido, fazendo com que as vias aéreas entrem em colapso.

Durante a fase do sono esses indivíduos ficam em hipercapnia, a respiração para e o CO2 que deveria ser liberado é acumulado no sangue. “Há relatos de humanos que recrutam a musculatura abdominal em uma condição de hipercapnia durante o sono, que é justamente a condição a que expusemos os animais durante o estudo”, disse Da Silva.

A exposição à hipercapnia utilizada no estudo provocou um aumento de 15 milímetros de mercúrio (mmHg) na corrente sanguínea dos ratos, algo semelhante ao que ocorre com humanos com apneia obstrutiva do sono. “Nessas situações, as respostas e atividade da musculatura respiratória, bem como os ajustes ventilatórios à hipercapnia, são altamente desejáveis”, escreveram os pesquisadores.

Segundo Da Silva, a descoberta é relativamente simples, mas traz alguns avanços importantes. “Um primeiro aspecto é o da perspectiva de controle neural da respiração. Não fizemos nenhum tipo de abordagem para investigar os mecanismos neurais, entretanto foi utilizado um modelo e métodos com alto valor integrativo em fisiologia do controle respiratório. Uma pergunta que fica é: uma vez que neurônios estão gerando atividade abdominal durante o sono, algum mecanismo deve ser responsável por ativar esses neurônios no sistema nervoso central. Entender esses mecanismos é um desafio que ainda está posto na literatura. A continuação desse estudo parte da proposta de investigar alguns possíveis mecanismos neurais que estão envolvidos nesse tipo de resposta”, disse.

O estudo foi comentado na seção Perspectives da mesma edição de The Journal of Physiology.

“A descoberta do aumento da expiração ativa durante o sono não REM é intrigante no contexto de uma diminuição generalizada da atividade muscular da via aérea superior, mas não do diafragma, durante o sono com relevância para os eventos obstrutivos das vias aéreas características da síndrome da apneia obstrutiva do sono”, escreveu Ken D. O’Halloran, do Departamento de Fisiologia da Faculdade de Medicina da University College Cork (Irlanda), que não participou do estudo.

De acordo com O’Halloran, a hipoventilação pode fornecer um estímulo adicional mediado por reflexo para recrutar a expiração ativa durante o sono, talvez defendendo-se contra a obstrução da respiração.

“Estudos sobre a fase expiratória do ciclo respiratório têm retornado ao palco central e nunca foram tão ativos. O estudo tecnicamente desafiador de Leirão e outros oferece uma perspectiva integrativa dos osciladores respiratórios do tronco encefálico, desvendando o padrão de recrutamento da musculatura abdominal durante desafios respiratórios, revelando as consequências mecânicas deste recrutamento na ventilação pulmonar”, escreveu O’Halloran. 

Agência Faepsp




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