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Domingo, 09 de julho de 2017, 07h35

Família hondurenha obtém refúgio no México após fugir da violência das gangues


Até onde você iria para evitar que sua filha fosse levada como escrava sexual pelo líder de uma gangue? Priscila* fez tudo o que pôde. No final, conseguiu salvar sua filha, mas a segurança de sua família, que vivia em Honduras, custou caro.

A vida da família costumava ser feliz e pacífica. Priscila e seu marido administravam juntos um comércio familiar e vendiam doces folhados, sucos frescos e bolos.

Foi quando os maras, uma quadrilha de criminosos, chegou ao bairro. A princípio, Priscila não se preocupou. A quadrilha os deixou em paz, só incomodando o comércio ilegal. Mas, logo, a realidade mudou.

Os maras começaram a assediar os proprietários do comércio local, intimidando e extorquindo com o “imposto de guerra”. As casas e estabelecimentos foram saqueadas. E se alguém ousasse resistir, a gangue mataria e jogaria os corpos no rio.

A amiga e vizinha de Priscila foi uma das pessoas que resistiu à extorsão da gangue. Foi morta junto com seus dois filhos pequenos. Os maras não demonstravam qualquer piedade, nem mesmo às crianças, que são, muitas vezes, recrutadas como informantes e espiãs.

Após o assassinato de sua amiga, Priscila sabia que deveria fazer algo para proteger sua família. Disse aos membros da gangue que daria tudo o que pedissem, com a condição de que deixassem sua família em paz. Apesar do acordo, a paz não durou muito tempo.

Depois de alguns dias, outro vizinho teve uma discussão com a gangue no meio da noite. Tiros foram disparados e, quando a polícia chegou, levaram a família para um local seguro. No dia seguinte, a gangue retornou e incendiou a casa.

Priscila rezou para que seu acordo com os maras fosse mantido, mas eles queriam mais do que dinheiro. Um dia, ela estava sozinha em casa quando um estranho entrou, segurando uma arma. Ela tentou não demonstrar medo quando ele perguntou sobre sua filha mais velha, que tinha sido escolhida para se tornar a nova “namorada” de seu chefe. Priscila estremeceu de medo enquanto explicava que a menina não estava em casa, e que não sabia quando voltaria.

Em todo o mundo, Honduras é o país que mais registra homicídios de mulheres, sendo que a maioria das vítimas tem menos de 24 anos. Os membros das gangues frequentemente escolhem “namoradas” que são estupradas, abusadas e mortas.

Naquela noite, Priscila e seu marido decidiram tomar medidas urgentes. Começaram a traçar um plano de fuga, que não seria tão facilmente executado já que eles tinham comércio, casa e quatro filhos para cuidar.

Com o passar dos dias, uma situação os fez perceber que não poderiam esperar. Priscila estava trabalhando na padaria quando um homem entrou e pediu água para se limpar. Suas mãos estavam cobertas de sangue. Ele perguntou sobre a filha dela.

Priscila respondeu que não sabia, mas a mensagem era clara. Depois que o homem se foi, ela ligou para o irmão, aterrorizada. Ele questionou: “está esperando matarem todos vocês de uma vez?”, e insistiu que a família fosse embora definitivamente.

Ela fechou a padaria, empacotou suas coisas e se mudou com a família para outro bairro na mesma cidade. Por um tempo, parecia que as coisas voltariam ao normal. Foi quando recebeu uma ligação da polícia pedindo que ela identificasse um corpo que havia sido brutalmente torturado: era de seu irmão.

Não havia como escapar da violência incessante que havia tomado conta do país. Enquanto andavam até a escola, seus filhos mais novos se depararam com um tiroteio entre gangues rivais. Esconderam-se das balas, mas viram diversas pessoas sendo atingidas pelos tiros. Quando o marido de Priscila os encontrou, estavam paralisados, em estado de choque.

Priscila estava em absoluto desespero. A família tinha pouco dinheiro, já que a maior parte havia sido entregue para pagar o “imposto de guerra”. Ela sabia que tinham somente alguns dias — talvez algumas horas — até que os maras viessem em busca de sua filha. Não haveria nada que pudesse fazer para detê-los. Tomaram, então, a dolorosa decisão de deixar tudo para trás e partir de Honduras para sempre.

Naquela noite, gastaram o pouco que tinham com passagens de ônibus. O mais longe que conseguiram chegar foi Hidalgo, na fronteira sul do México. Um desconhecido deu carona até a Comissão Mexicana de Ajuda a Refugiados (COMAR).

A família de Priscila estava finalmente segura. No entanto, devido ao alto nível de estresse ao qual foi submetida, ela teve um colapso nervoso enquanto preenchia os formulários de solicitação de refúgio.

“Eu estava perdida e com medo. Não conhecia ninguém, e me senti um peixe fora d’água. Preenchi os papéis o mais rápido que pude para poder sair e chorar, sem que as pessoas ficassem nos encarando”, disse.

Seu marido tentou confortá-la, dizendo que tudo seria melhor dali em diante. Contudo, também as crianças apresentaram sintomas de extremo estresse, com dores no estômago, enxaquecas e taquicardia em suas primeiras semanas no México.

Apesar das dificuldades recorrentes, Priscila e sua família perceberam que uma nova vida seria possível, e que as coisas iriam ficar bem. Sabem que são sortudos de terem uns aos outros e, aos poucos, estão se acostumando em ter segurança novamente.

A equipe local da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) tem dado apoio, visitando a família com frequência. Priscila se inscreveu no programa de assistência financeira, que ajuda a cobrir as despesas com alimentos e de aluguel do pequeno apartamento em que vivem.

Finalmente, boas notícias chegaram até a família: foram reconhecidos como refugiados no México e poderão mandar seus filhos para a escola e, quem sabe, um dia abrir um novo comércio. Aos poucos, suas vidas estão retornando à normalidade — uma nova fase em paz e cheia de possibilidades.

*Todos os nomes foram alterados por motivos de proteção. 




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