Cuiabá | MT 19/03/2024
Justiça e Direito
Segunda, 18 de junho de 2018, 18h03

Ministérios públicos rechaçam proposta de estadualizar o Parque de Chapada dos Guimarães


.

Em um momento em que o Estado de Mato Grosso se articula para 'estadualizar' o Parque Nacional de Chapada dos Guimarães, os ministérios públicos do Estado de Mato Grosso e o Federal manifestam-se veementemente contrários a proposta, emitindo notas a respeito do tema. Em nível estadual, é pontuado falhas no contexto de atualização de informações - inclusive sobre a duplicação de rodovia de acesso a cidade de Chapada dos Guimarães, enquanto que em nível do órgão federal é afirmado que a proposta já parece natimorta, que dentre vários pontos, se dá por expressa vedação legal, devidamente reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Confira as notas abaixo:

MPE lembra de 'enfraquecimento' do Estado em relação aos parques estaduais

O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, por meio da Procuradoria Especializada de Defesa do Meio Ambiente e da Ordem Urbanística, das Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente Natural da capital, da Promotoria de Justiça da Bacia Hidrográfica do Cuiabá e das Promotorias de Justiça Cível e Criminal da comarca de Chapada dos Guimarães vem se manifestar contrário a eventual proposta de Estadualização do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães pelos seguintes motivos:

1. O Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, localizado nos Municípios de Cuiabá e Chapada dos Guimarães, criado pelo Decreto Federal n. 97.656, de 12 de Abril de 1989, tem como objetivo “proteger e preservar amostra dos ecossistemas ali existentes, assegurando a preservação de seus recursos naturais, proporcionando oportunidades controladas para uso pelo público, educação, pesquisa científica e também contribuindo para a preservação de sítios arqueológicos existentes na área”. Trata-se, na forma da Lei n. 9.985/00, de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral de domínio da União Federal, cuja atribuição para gestão está afeta ao ICMBio.

2. A proposta de sua estadualização resultaria em possíveis desapropriações de terras federais por parte da unidade da federação, o que se mostra juridicamente impossível sob o pálio do §2° do art. 2° do Decreto Federal n. 3.365/1941 que veda expressamente ao Estado desapropriar bens da União.

3. Ainda que houvesse tal possibilidade ou ajuste consensual com a União, seria necessário o dispêndio de recursos públicos tanto para as aquisições quanto para a consolidação da Unidade de Conservação. Nesse caso, ensejando aumento de despesas ao Estado, demandaria iniciativa exclusiva do Poder Executivo com indicação de origem dos recursos (conforme premissas constitucionais e da Lei de Responsabilidade Fiscal).

4. Historicamente o Estado de Mato Grosso não tem demonstrado preocupação político/ambiental com o sistema de unidades de conservação estadual. Não cuida sequer das que estão instituídas:

4.1. Das 46 (quarenta e seis) Unidades de Conservação Estaduais instituídas legalmente, embora com prazos para instituições esgotados, 31 (trinta e uma) não possuem Plano de Manejo. Além disto 34 (trinta e quatro) não ainda possuem Conselho Gestor1. Somente na região em que se pontua a estadualização existem três Unidades de Conservação Estaduais, costumeiramente locais de queimadas criminosas, que necessitam de atenção estatal visando elaboração de Plano de Manejo, consolidação e estruturação: Estrada Parque de 25 km da Rodovia MT 251, APA Chapada dos Guimarães e Estação Ecológica do Rio da Casca.

4.2. Nos últimos meses houve várias tentativas de iniciar o projeto de duplicação da Estrada Parque MT 251, sem sequer apresentar os projetos consistentes do impacto que ssa obra gigantesca traria ao frágil ecossistema do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães, especialmente o projeto executivo da obra, além de outros pontos ainda não esclarecidos. Como o governo não pretende aprofundar nesses estudos, encontrou muita resistência popular no projeto de duplicação nas audiências públicas realizadas tanto em Cuiabá quanto em Chapada dos Guimarães. A estadualização propugnada facilitaria o projeto já que poderia afastar o controle de órgão federais, tais como ICMBio e o próprio Ministério Público Federal, enfraquecendo o sistema de proteção ambiental.

4.3. Não existem informações atualizadas sobre a situação ambiental, cartorária e fundiária das Unidades de Conservação Estaduais, sendo que o contrato que havia sido firmado para realizar tais levantamentos teve sua execução suspensa.

4.4. Algumas recentes iniciativas da Assembleia Legislativa no tema alusivo à proteção das Unidades de Conservação Estaduais trouxeram indicativos de enfraquecimento do sistema de proteção. À guisa de exemplo lembram-se os seguintes casos: a) em 2006 houve tentativa de se reduzir o Parque Estadual Cristalino; b) Em 2016, no caso da Reserva Extrativista Guariba Roosevelt, a Assembleia Legislativa expediu o Decreto Legislativo 51/2016 diminuindo a RESEX, o que foi rechaçado pelo Ministério Público Estadual e teve seus efeitos suspensos pelo Poder Judiciário Estadual; c) em 2017 tentou-se diminuir o Parque Estadual Serra de Ricardo Franco. Na ocasião houve o concurso dos poderes Legislativo e Executivo para fragilizar o sistema de proteção desta Unidade de Conservação, conforme amplamente divulgado pela mídia e combatido pelo Ministério Público em ações judiciais próprias; d) Tramita na Assembleia Legislativa projeto visando diminuir o sistema de proteção da Unidade de Conservação APA Cuiabá visando sejam autorizados desmatamentos nas áreas ambientalmente protegidas, o que também conta com repúdio ministerial.

4.5. As fiscalizações de crimes ambientais praticados em Unidades de Conservação Estaduais são inexpressivas e insuficientes, sendo necessário seja a SEMA dotada de equipe técnica, orçamento e recursos (materiais, humanos e de processamento de dados) para o enfrentamento do problema de desmatamentos, queimadas, pesca e caça no interior destas áreas destinadas à proteção da biodiversidade.

5. Antes de se buscar assumir responsabilidades inerentes ao Governo Federal, com implementação de ônus a serem custeados com orçamentos estaduais, deve o Estado de Mato Grosso focar na consolidação das Unidades de Conservação que estão legalmente instituídas e dependem de investimentos visando verter essa dominialidade para o Estado e promover medidas efetivas de proteção, elaborando planos de manejo, dotando cada uma das 46 Unidades de Conservação Estaduais com estruturas administrativas mínimas, instituindo seus Conselhos Gestores, promovendo fiscalizações contra invasões, desmatamentos, queimadas e todo tipo de outros crimes ambientais que costumeiramente ocorrem nestas áreas.

6. Por essas considerações, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso se posiciona frontalmente contrário à estadualização do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães e conclama a Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso a exigir do Poder Executivo local comprometimento com a consolidação e efetiva fiscalização das Unidades de Conservação Estaduais.

Cuiabá/MT., 18 de junho de 2018.

Luiz Alberto Esteves Scaloppe
Procurador de Justiça

Joelson de Campos Maciel
Promotor de Justiça de Meio Ambiente de Cuiabá

Marcelo Caetano Vacchiano

Promotor de Justiça de Meio Ambiente de Cuiabá

Maria Fernanda Correa da Costa
Promotora de Justiça da Bacia Hidrográfica do Cuiabá

Leandro Volochko
Promotor de Justiça de Chapada dos Guimarães

Solange Linhares
Promotora de Justiça de Chapara dos Guimarães

Dentre vários pontos MPF lembra fragilidade financeira do Estado sobre sua própria obrigação

O Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso, por meio do Ofício de Tutela do Meio Ambiente e do Patrimônio Cultural, se posiciona por meio de nota pública sobre a realização de audiência pública para debater a Estadualização do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães, e sobre o mérito da proposta em si, conforme abaixo, pelo procurador da República, titular do Ofício do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, Pedro Melo Pouchain Ribeiro. Clique aqui para acessar a original.

"Aportou a esta Procuradoria da República no estado de Mato Grosso o convite do Deputado Estadual, Wilson Santos, para participação em audiência pública a ser realizada neste dia 18 de junho de 2018, às 14:30, na sede da Assembleia Legislativa, para debater a “Estadualização do Parque Nacional Chapada dos Guimarães”. Diante da mobilização da sociedade civil organizada quanto ao tema e com o intuito de contribuir na boa direção dos trabalhos, reputou-se oportuno a divulgação pela presente via do entendimento deste órgão ministerial.

Importa ressaltar que as audiências públicas são fóruns adequados para a qualificação e livre circulação de ideias. Nesse sentido, em alguma medida, este evento busca fomentar a participação popular na gestão ambiental do estado de Mato Grosso.

Quanto ao mérito da proposta, alerta-se que uma súbita proposta de “estadualização” do Parque Nacional Chapada dos Guimarães parece natimorta. É que o Parque Nacional Chapada dos Guimarães se constitui em unidade de conservação de proteção integral, de posse e domínio federal1. Por esse motivo, encontra-se fora da esfera de poder do estado de Mato Grosso a desapropriação do referido imóvel. Isso se dá por expressa vedação legal2, já devidamente reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF)3.

E, como se não bastasse, especificamente para hipótese de sobreposição de interesses federal e estadual na conservação ambiental de uma determinada área – sem nem mesmo aprofundar às consequências indesejadas de um potencial conflito federativo entre Mato Grosso e União Federal – a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem conferido preponderância ao interesse federal por seu caráter mais abrangente4.

Some-se a tudo isso ser notória a atual dificuldade orçamentária do estado de Mato Grosso; o que já lhe tem comprometido o bom cumprimento de suas mais básicas obrigações financeiras, pondo dúvida sobre sua real capacidade de gerir e aportar recursos em grau mais satisfatório em uma das mais importantes e sensíveis undidades de conservação do estado.

Por tudo isso, sugere-se que esta audiência pública, como típico fórum para o exercício da democracia deliberativa, possa ser melhor aproveitada para o debate e discussão da gestão ambiental estadual em suas próprias unidades de conservação, tanto em termos de fortalecimento de estrutura como, principalmente, na elaboração e implementação dos necessários planos de manejo.

Cuiabá, 18 de junho de 2018.

Pedro Melo Pouchain Ribeiro
Procurador da República


1Art. 11, §1º, da Lei nº 9.985/2000.

2Art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941

3Conforme precedente no Recurso Extraordinário - RE nº 172.816, Relator: Min. Paulo Brossard, PLENO, julgado em 09/02/1994, DJ 13-05-1994, PP-11365 EMENT VOL-01744-07 PP-01374.

4Consoante julgamento proferido na AC 1255 MC-AgR, Relator(a): Min. Celso de Mello, Tribunal PLENO, julgado em 27/06/2007, DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014 EMENT VOL-02754-01 PP-00110.




Busca



Enquete

O Governo de MT começou a implantar o BRT entre VG e Cuiabá. Na sua opinião:

Será mais prático que o VLT
Vai resolver o problema do transporte público.
É uma alternativa temporaria.
  Resultado
Facebook Twitter Google+ RSS
Logo_azado

Plantão News.com.br - 2009 Todos os Direitos Reservados.

email:redacao@plantaonews.com.br / Fone: (65) 98431-3114