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Perder a liberdade era o prejuízo máximo calculado pela costureira Fabiana da Silva quando no tráfico de pasta-base de cocaína ela viu uma chance de ascensão financeira que o trabalho convencional não permitiria. A solidão e o abandono da família não faziam parte do plano. Prestes a deixar a Penitenciária Ana Maria do Couto May, em Cuiabá, ela afirma convicta que o crime não compensa. A cada 100 mulheres que chegam ao Sistema Prisional de Mato Grosso, menos de 10 são reincidentes.
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Fabiana cumpre pena há dois anos e meio, desde que foi flagrada transportando pasta-base de Cáceres para Primavera do Leste. “Durante 10 meses viajei para comprar a pasta-base, mas não entendia como era a vida dos viciados. Meu marido trabalhava como marceneiro durante o dia e a noite ele era quem vendia a droga. Olho para trás e penso na dor que causamos a tantas famílias e como eu jamais aceitaria que alguém fizesse isso a minha filha”, lamenta.
Os cursos profissionalizantes feitos na penitenciária já renderam a ela uma oportunidade, a de trabalhar na confecção que funciona dentro da unidade feminina e emprega outras 15 mulheres. “Além de atender aos clientes externos, fabricamos também o uniforme de todos os reeducandos do Estado. São 1.200 peças por mês”, explica a coordenadora de produção, Ângela de Souza. As trabalhadoras recebem o salário da forma estabelecida na Lei de Execuções Penais.
Enquanto Fabiana encontrou incentivo para a costura, Ariadne Bezerra está aprendendo a fazer bolsas de couro na empresa Pantanal, também instalada na unidade prisional por incentivo do governo estadual. “Aprendi a dar forma às bolsas antes do processo de costura. Além do trabalho ser remunerado, não penso tanto em como seria estar ‘lá fora’”. Com 23 anos, a universitária cearense foi presa em território mato-grossense por tráfico internacional de drogas.
Junto a um grupo de três amigos, Ariadne planejava transportar cocaína para a Bélgica, mas a mala com fundo falso foi descoberta pela Polícia Federal no Aeroporto Marechal Rondon, em Várzea Grande. Agora ela cumpre a sentença de oito anos e oito meses de prisão. Inconsequente à época, ela fala que já havia viajado para a Europa com outros carregamentos. “Eu pensava que só a viagem para o exterior já fazia valer a pena, até o dia em que fui presa”.
Agora com o novo emprego, Ariadne também se prepara para retomar os estudos de graduação. “Participei do cursinho oferecido aqui na penitenciária e consegui uma boa pontuação no Enem. Estou tentando uma bolsa do ProUni para continuar o curso de Publicidade em uma universidade particular”. Com escolta policial, os reeducandos podem participar de aulas fora do presídio, mas cada caso é avaliado individualmente.
A diretora da penitenciária feminina, Fabiana Auxiliadora Soares, conta que no total 150 reeducandas trabalham pela remissão de pena, desde o serviço nas dependências da unidade até a atividade remunerada nas fábricas e esse é um grande diferencial para o resgate social. “Somente na cozinha temos três equipes de 15 pessoas, que revezam para fazer as refeições diárias para as 460 detentas e para os funcionários”. A cada três dias trabalhados, elas conquistam a redução de um dia na pena.
CASE INSPIRA FORMATO PAPA PRESÍDIO PRODUTIVO -No ano de 2008, a CPI do Sistema Carcerário da Câmara Federal considerou a Penitenciária Feminina Ana Maria do Couto May a melhor do país para mulheres, sendo a segunda do ranking geral. A diretora da unidade afirma que recuperar a autoestima das reeducandas e inserí-las em uma nova realidade profissional é uma diretriz que há anos faz parte do planejamento do sistema prisional do Estado de Mato Grosso. “Trazemos todos os cursos possíveis para dentro da unidade por meio do Senai e do Senac. Atualmente 120 reeducandas estão se qualificando com formação em Nutrição, Manicure e Pedicure, Desenho de Moda, Informática e Produção de Biscoitos e Salgados”, frisa a diretora da unidade prisional, Fabiana Auxiliadora Soares.
Aulas diárias, que vão da alfabetização ao preparo para o Exame Nacional para Certificação de Competência de Jovens e Adultos (Encceja), também são oferecidas a 94 mulheres em um espaço que funciona como escola no local.
O psicólogo do Sistema Prisional do Estado, Walter Mutran, pontua que o atendimento diferenciado na unidade é o principal estímulo para que as mulheres não voltem a cometer delitos. “Quando elas reconhecem o erro, não se martirizam e conseguem ter perspectivas para o futuro. Com o incentivo do estudo e da profissionalização, vislumbram oportunidades que antes da prisão não conseguiam enxergar. Elas passam pelo abandono da família, perdem os companheiros e descobrem que nada compensa viver sem dignidade”, conclui.
O baixo índice de reincidência registrado entre as reeducandas é uma das bases da proposta de instalar nas unidades masculinas o modelo de qualificação e absorção da mão-de-obra que estimule a ressocialização. O projeto prevê a instalação de seis núcleos de produção industrial no entorno das principais unidades prisionais. “O presídio produtivo possibilitará a qualificação dos presos para o mercado de trabalho. A exclusão não pode ser um motivo para a reincidência criminal”, avalia o governador Silval Barbosa.
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